Da Academia aos Jogos: Uma Jornada Inesperada

Quando Sachi Schmidt-Hori, professora associada de Literatura e Cultura Japonesa na prestigiada Universidade Dartmouth, recebeu os primeiros e-mails da Ubisoft, a reação foi de desconfiança. "Achei que fosse spam", confessa a acadêmica, que nunca tinha ouvido falar da franquia Assassin's Creed. Somente após intervenção de colegas e do próprio marido – um entusiasta de games – é que Schmidt-Hori percebeu a importância do convite.

Seu trabalho começou com pesquisas pontuais sobre o Japão feudal do século XVI, período em que se passa Assassin's Creed Shadows. "Eram questões muito específicas que não se resolviam com uma simples busca no Google", explica. Detalhes sobre templos budistas, hierarquias sociais e tratamento de grupos marginalizados exigiam um conhecimento profundo que poucos possuíam fora do Japão.

A Tempestade Perfeita: Críticas e Polêmicas

O lançamento do trailer em maio de 2024 revelou os protagonistas: Naoe, uma shinobi mulher, e Yasuke, um samurai negro baseado em figura histórica. A escolha gerou debates acalorados, mas também ataques coordenados. Schmidt-Hori, cuja identidade era facilmente rastreável por seu trabalho acadêmico, tornou-se alvo principal.

"Havia múltiplos grupos com motivações distintas", analisa. "Alguns eram homens asiáticos na diáspora que se sentiam traídos; outros, ativistas anti-diversidade se aproveitando da situação." A pesquisadora identificou padrões familiares: "É uma estratégia clássica de supremacia branca usar asiáticos como contraponto a outros grupos minoritários".

  • Críticas à representação histórica

  • Ataques pessoais baseados em seu trabalho acadêmico

  • Questionamentos sobre a legitimidade de Yasuke como personagem

Enfrentando os Trolls: Estratégias Inusitadas

Diferente da maioria, Schmidt-Hori optou por engajar diretamente com alguns de seus críticos. "Conversei por Zoom com um deles", revela. "Expliquei que meu trabalho acadêmico justamente discutia as masculinidades asiáticas que eles diziam defender." Em alguns casos, a abordagem funcionou – posts foram removidos após diálogo.

"Eles criaram uma versão imaginária de mim que não corresponde à realidade"

Quanto aos ataques mais virulentos, a pesquisadora manteve distância. "Quando a lógica não importa, não vale a pena discutir", pondera. Mesmo assim, conseguiu que um influenciador de direita removesse conteúdo difamatório após um email contundente sobre as consequências reais de seu discurso.

Lições para a Indústria de Games

A experiência deixou marcas. Ubisoft passou a proteger mais a identidade de desenvolvedores em materiais promocionais, usando apenas primeiros nomes. Schmidt-Hori critica a falta de preparo da empresa: "Eles poderiam ter previsto isso e nos preparado melhor".

Hoje, com o jogo lançado e a poeira baixando, a professora reflete sobre o episódio: "No final, estavam atacando uma caricatura, não a mim". Seu conselho para outros pesquisadores? "Conheça seu material tão bem que nenhum argumento raso te abale."

Com informações do: Eurogamer