Dois clássicos do Studio Ghibli compartilham um simbolismo oculto

Quem acompanha o trabalho do Studio Ghibli sabe que Hayao Miyazaki tem um talento único para inserir simbolismos profundos em suas obras. Mas você sabia que dois de seus maiores sucessos - A Viagem de Chihiro (2001) e O Castelo Animado (2004) - estão conectados por um detalhe fascinante?

Embora sejam histórias completamente diferentes, ambas compartilham uma cena quase idêntica que passa despercebida para muitos espectadores. Trata-se do momento em que os protagonistas atravessam um portal para um mundo mágico - e a maneira como isso é retratado tem um significado especial.

O simbolismo da travessia nos filmes de Miyazaki

Nos dois filmes, a passagem para o mundo fantástico acontece através de:

  • Um túnel estreito e aparentemente comum

  • Uma transição de luz para escuridão e vice-versa

  • Uma sensação de desorientação seguida de deslumbramento

Essa escolha visual não é acidental. Miyazaki frequentemente usa elementos arquitetônicos como metáforas para transições emocionais e psicológicas. O túnel representa não apenas uma mudança física de local, mas uma jornada interior para os personagens principais.

O que essa conexão revela sobre o estilo de Miyazaki

Analisando os dois filmes em conjunto, percebemos alguns padrões característicos do diretor:

  • A importância da jornada do herói como processo de amadurecimento

  • A fronteira tênue entre o mundo real e o fantástico

  • A representação visual de momentos decisivos na narrativa

Curiosamente, enquanto em A Viagem de Chihiro o túnel leva a um mundo de espíritos e criaturas mágicas, em O Castelo Animado ele conduz a um reino em guerra dominado pela tecnologia. Essa dualidade reflete a visão complexa de Miyazaki sobre tradição versus progresso.

As diferenças sutis na abordagem de cada travessia

Embora a estrutura básica seja similar, Miyazaki introduz variações significativas na forma como cada protagonista experiencia a passagem. Em A Viagem de Chihiro, a travessia pelo túnel é acompanhada por uma crescente sensação de apreensão - os pais de Chihiro avançam confiantes enquanto ela hesita, prenunciando seu papel como única pessoa capaz de navegar aquele mundo.

Já em O Castelo Animado, Sophie atravessa o portal quase por acidente, num momento de distração. Essa diferença reflete a personalidade das protagonistas: Chihiro é inicialmente relutante enquanto Sophie aceita o fantástico com relativa naturalidade, apesar de seu pragmatismo inicial.

Comparação entre as expressões de Chihiro e Sophie durante as cenas de travessia

O significado cultural por trás dos túneis

Na cultura japonesa, túneis e portais têm um significado especial na mitologia e no folclore. Eles frequentemente representam:

  • A transição entre o mundo dos vivos e o dos espíritos (como no festival Obon)

  • Passagens para reinos paralelos ou dimensões alternativas

  • Testes de coragem e determinação

Miyazaki resgata essa tradição, mas a adapta para suas narrativas. Nos dois filmes, o túnel funciona como um filtro - apenas aqueles com certas qualidades (como pureza de coração em Chihiro ou humildade em Sophie) conseguem não apenas entrar, mas também retornar do mundo mágico.

Elementos técnicos que reforçam o simbolismo

Além do conteúdo narrativo, a direção de arte e a cinematografia dessas cenas foram cuidadosamente planejadas. Observe como:

  • A paleta de cores muda drasticamente antes e depois da travessia

  • O som ambiente desaparece momentaneamente dentro do túnel

  • A câmera assume o ponto de vista do personagem durante a passagem

Essas escolhas técnicas imergem o espectador na mesma experiência de desorientação e descoberta que os protagonistas vivem. É interessante notar que, enquanto em Chihiro a câmera treme levemente durante a travessia (refletindo sua ansiedade), em Sophie o movimento é mais suave, quase flutuante.

Outras conexões entre os filmes além dos túneis

A semelhança nas cenas de travessia não é a única ligação entre essas obras. Ambos os filmes compartilham:

  • Protagonistas femininas que desafiam expectativas sociais

  • Criaturas mágicas que representam aspectos da natureza

  • Críticas sutis ao consumismo e à industrialização

  • Transformações físicas ligadas ao crescimento emocional

Esses temas recorrentes mostram como Miyazaki constrói um universo coeso através de suas obras, mesmo quando contam histórias aparentemente desconexas. O uso de elementos visuais similares - como os túneis - funciona quase como uma assinatura autoral, um convite para compararmos suas diferentes visões sobre jornadas de amadurecimento.

Com informações do: IGN