O desafio de ser entrevistado por uma inteligência artificial
Imagine se preparar cuidadosamente para uma entrevista de emprego, estudar a empresa, ensaiar suas respostas e, no momento decisivo, descobrir que seu entrevistador é... um algoritmo. Essa situação, que parece saída de um episódio de Black Mirror, tem se tornado cada vez mais comum no mercado de trabalho atual.
E o pior? Muitos candidatos estão relatando experiências frustrantes com esses sistemas automatizados. Perguntas desconexas, dificuldade em entender respostas mais complexas e até mesmo problemas técnicos que interrompem o processo seletivo.
Os problemas das entrevistas automatizadas
Quem já passou por essa experiência costuma relatar diversos problemas:
Falta de capacidade para interpretar nuances nas respostas
Dificuldade em lidar com pausas naturais da conversação
Perguntas repetitivas ou fora de contexto
Ausência total de feedback humano após o processo
"É desconcertante falar para uma tela sem saber se alguém realmente está avaliando suas respostas", comenta um candidato que preferiu não se identificar. "No final, você fica com a sensação de que foi julgado por critérios que ninguém te explicou."
Por que as empresas estão adotando essa tecnologia?
Apesar dos problemas, o uso de IAs em processos seletivos vem crescendo. As empresas argumentam que essa abordagem permite:
Analisar um número maior de candidatos
Reduzir vieses inconscientes (embora isso seja debatível)
Acelerar o tempo de contratação
Cortar custos com recrutamento
Mas será que a economia justifica a perda da conexão humana em um processo tão importante? Especialistas em RH alertam que nenhum algoritmo, por mais sofisticado que seja, consegue captar completamente as qualidades de um candidato.
O lado humano que as IAs ainda não conseguem replicar
Enquanto as empresas celebram a eficiência das entrevistas automatizadas, muitos candidatos sentem falta daquilo que só um recrutador humano pode oferecer. A capacidade de ler linguagem corporal, perceber o tom de voz ou até mesmo fazer uma pergunta de acompanhamento baseada na resposta anterior são habilidades que permanecem exclusivamente humanas.
"Tive uma entrevista onde a IA simplesmente não entendia que eu estava dando exemplos concretos da minha experiência", relata Mariana, designer de 32 anos. "Quando um recrutador humano ouve 'trabalhei em um projeto similar para a empresa X', ele pode perguntar detalhes. A IA só seguia para a próxima pergunta pré-programada."
Quando a tecnologia atrapalha mais do que ajuda
Alguns casos chegam a ser cômicos, se não fossem tão frustrantes. Relatos incluem sistemas que:
Interpretaram erroneamente sotaques regionais
Desclassificaram candidatos por pausas muito longas (mesmo quando pensando em respostas complexas)
Repetiram exatamente a mesma pergunta três vezes seguidas
Não conseguiram processar respostas que fugiam do roteiro pré-determinado
Um caso particularmente absurdo envolveu um candidato cujo vídeo travou durante a entrevista. O sistema continuou fazendo perguntas para uma imagem congelada, depois enviou um e-mail automático dizendo que ele "não demonstrou engajamento suficiente".
O que os especialistas em recrutamento pensam sobre isso?
Consultores de carreira estão divididos. Alguns veem valor no uso inicial de IAs para triagem de currículos, mas defendem que as etapas decisivas devem sempre envolver humanos. Outros alertam que mesmo o uso inicial pode filtrar bons candidatos por critérios questionáveis.
"Estamos vendo casos de pessoas altamente qualificadas sendo rejeitadas porque não usaram as palavras-chave exatas que o sistema estava procurando", explica a consultora de RH Carla Mendes. "Por outro lado, candidatos que aprenderam a 'jogar o jogo' do algoritmo estão passando sem ter necessariamente as melhores qualificações."
O debate levanta questões importantes sobre justiça e transparência nos processos seletivos. Se nem os candidatos nem os próprios recrutadores entendem completamente como as decisões são tomadas, como podemos falar em igualdade de oportunidades?
Com informações do: IGN Brasil