Daggerheart: uma resposta criativa aos problemas do D&D

O sucesso do programa Critical Role ajudou a popularizar a 5ª edição de Dungeons & Dragons, mas agora a equipe por trás do fenômeno decidiu criar sua própria alternativa. Daggerheart, o novo RPG de mesa da Darrington Press (selo editorial da Critical Role), chega ao mercado com soluções inteligentes para algumas das limitações mais discutidas do D&D 5e.

Ilustração de personagem do Daggerheart

Problemas do D&D e como o Daggerheart os resolve

1. O fracasso pode ser frustrante

No D&D tradicional, rolar um 1 natural geralmente significa que nada acontece - seu ataque erra, você não consegue abrir a fechadura, a pista escapa. Daggerheart muda isso radicalmente com um sistema de dois d12s: um representa esperança, o outro medo. O número maior determina qual emoção domina o resultado.

  • Sucesso com esperança: tudo vai bem para os jogadores

  • Falha com esperança: os jogadores ganham pontos de esperança como consolação

  • Falha com medo: o mestre ganha pontos de medo para criar complicações

O resultado? Nenhum teste é realmente sem consequências. Se você falha em abrir uma porta, talvez ouça guardas se aproximando ou ative uma armadilha. A história sempre avança.

Personagem místico do Daggerheart

2. Vantagem e desvantagem são extremas

O sistema de vantagem/desvantagem do D&D 5e (rolar dois d20 e pegar o melhor/pior) é elegante, mas a diferença matemática é enorme. Daggerheart mantém o conceito, mas substitui por um modificador de +d6 ou -d6, tornando o impacto mais sutil.

Além disso, o jogo simplifica a lista de condições do D&D para apenas três opções: escondido, restrito e vulnerável. Menos dor de cabeça para mestres iniciantes.

3. Raça e antecedentes limitam construções

No D&D tradicional, escolher uma raça ou antecedente que não dê bônus para suas estatísticas principais pode deixar seu personagem significativamente mais fraco. Daggerheart separa completamente atributos dessas escolhas:

  • Atributos são determinados pela classe

  • Raças e antecedentes dão habilidades temáticas, mas amplamente úteis

  • Um gigante ganha pontos de vida extras

  • Um personagem criado na natureza pode se mover silenciosamente

O resultado? Mais liberdade criativa sem penalizações mecânicas.

Criatura mágica do universo Daggerheart

4. Desequilíbrio entre classes mágicas e não-mágicas

Enquanto no D&D tradicional conjuradores têm dezenas de opções por nível, guerreiros muitas vezes se limitam a "eu ataco", Daggerheart oferece um sistema de cartas inspirado no D&D 4e e Gloomhaven:

  • Todas as classes ganham novas cartas ao subir de nível

  • Um mago pode aprender um escudo rúnico

  • Um bardo pode inspirar aliados com palavras de incentivo

  • Multiclasse se torna simples - basta pegar cartas de outras classes

Oportunidades perdidas e próximos passos

Apesar das inovações, Daggerheart ainda tem áreas que precisam de desenvolvimento. O sistema de itens e tesouros é vago, com descrições como "um punhado de ouro" em vez de valores concretos. Armas seguem uma progressão linear previsível, mas as regras são repetitivas em vez de condensadas em fórmulas.

Itens mágicos recebem nomes como "Varinha de Essek" ou "Arco Aantari", mas sem descrições que os tornem memoráveis como os artefatos do D&D. E a seção sobre ações durante períodos de descanso é especialmente superficial.

Daggerheart já está disponível em lojas especializadas e no site da Critical Role, com PDF gratuito na compra do livro físico. A partir de 3 de junho, chegará à Amazon e grandes livrarias. Para quem quer experimentar antes de comprar, a versão beta gratuita permanece disponível no DriveThruRPG.

Explorando o potencial narrativo do Daggerheart

Onde Daggerheart realmente brilha é na sua abordagem narrativa. Enquanto o D&D tradicional muitas vezes exige que o mestre improvise consequências para falhas, o sistema de esperança e medo do Daggerheart cria um fluxo orgânico de tensão e recompensa. Imagine uma cena onde:

  • Os jogadores falham em persuadir um nobre (medo domina) - agora ele exige um favor perigoso

  • Mas ganham pontos de esperança que podem usar para descobrir um segredo sobre ele

  • O mestre, com seus pontos de medo, introduz um espião observando a interação

Essa mecânica cria uma dança narrativa onde cada rolagem move a história para frente, mesmo quando os jogadores "fracassam". É uma solução elegante para o problema clássico de "nada acontece" que plaga muitos sistemas tradicionais.

Personalização além das estatísticas

Outro avanço notável é como Daggerheart lida com a progressão de personagens. Ao invés de escolher entre caminhos pré-definidos (como arquétipos no D&D), os jogadores montam seu próprio conjunto de habilidades através de cartas. Um guerreiro pode:

  • Se especializar em proteção, pegando cartas que permitem absorver dano por aliados

  • Ou focar em mobilidade, com habilidades de ataque em movimento

  • Ou até misturar algumas cartas de bardo para um estilo de capitão inspirador

O sistema lembra um pouco a liberdade dos jogos deck-building, onde você constrói seu próprio estilo de jogo através de combinações únicas. E como as cartas são físicas (ou digitais, no PDF), fica visualmente claro quais opções estão disponíveis a cada momento.

O desafio do equilíbrio

Claro, toda essa liberdade traz seus próprios desafios. Durante as sessões de teste, alguns grupos relataram que:

  • Combinações específicas de cartas podem se tornar dominantes

  • O ritmo de jogo diminui quando jogadores ficam "paralisados" por muitas opções

  • Mestres precisam se adaptar à imprevisibilidade das interações entre cartas

Mas esses são problemas esperados em qualquer sistema novo. A equipe da Darrington Press já anunciou que está monitorando feedback e planeja atualizações balanceadas. Afinal, Critical Role sabe bem como jogadores criativos podem ser - quem não se lembra do caos que era o grupo do Vox Machina?

Comparando cenários: Exandria vs. Heartlands

Enquanto o D&D da Critical Role se passa em Exandria, Daggerheart apresenta o mundo das Heartlands. As diferenças temáticas são marcantes:

Exandria (D&D) Heartlands (Daggerheart) Tonalidade Fantasia heroica clássica Fantasia sombria com toques de esperança Magia Sistemática, com escolas definidas Orgânica, ligada a emoções e símbolos Divindades Panteão estruturado Deuses misteriosos e distantes

Essa mudança de cenário permite que Daggerheart escape das expectativas do D&D. Um clérigo nas Heartlands não precisa seguir um deus específico - sua fé pode ser em conceitos como "a Chama Eterna" ou "o Primeiro Sussurro". Essa abstração dá mais espaço para interpretação criativa.

O que esperar do futuro

A Darrington Press já mencionou planos ambiciosos para expandir o universo de Daggerheart. Rumores sugerem que:

  • Um suplemento focado em reinos subterrâneos está em desenvolvimento

  • Regras para navios e viagens oceânicas podem ser a próxima grande adição

  • A equipe está considerando um bestiário expandido com criaturas mais exóticas

E com a tradição da Critical Role em contar histórias épicas, é quase certo que veremos campanhas oficiais que mostrem o potencial narrativo do sistema. Talvez até uma nova série de streaming usando as regras do Daggerheart?

Com informações do: Polygon