O poder do número três nos mangás e animes
Será que o número três guarda o segredo do sucesso que tantos mangakás buscam? Ao analisar os principais títulos shonen das últimas décadas, um padrão curioso se repete: a formação de trios protagonistas. De Dragon Ball a Naruto, passando por One Piece, essa estrutura narrativa parece ser mais do que mera coincidência.
Na verdade, essa fórmula oferece vantagens criativas significativas. Com três personagens principais, os autores conseguem:
Criar dinâmicas interpessoais mais ricas e variadas
Distribuir arquétipos complementares (o forte, o inteligente e o emocional)
Desenvolver conflitos internos no grupo sem romper completamente a equipe
Oferecer identificação para diferentes tipos de fãs
Anatomia de um trio shonen bem-sucedido
Analisando casos clássicos, percebemos padrões interessantes. Em Dragon Ball, por exemplo, Goku, Vegeta e Piccolo representam três abordagens distintas para o crescimento pessoal e combate. Enquanto Goku é o talento natural, Vegeta personifica a disciplina obsessiva e Piccolo traz a sabedoria estratégica.
Mas por que essa combinação funciona tão bem? Psicologicamente, trios criam um equilíbrio estável o suficiente para manter coesão, mas com tensão suficiente para gerar conflitos interessantes. Dois personagens podem criar uma dinâmica muito binária (amigo/rival), enquanto quatro ou mais diluem o desenvolvimento individual.
E você, já parou para pensar como seus trios favoritos se complementam? A química entre Luffy, Zoro e Sanji em One Piece é diferente da relação entre Naruto, Sasuke e Sakura, mas ambas seguem princípios similares de contraste e complementaridade.
Além do shonen: a trindade na cultura pop
Curiosamente, essa estrutura não se limita aos mangás. Na cultura ocidental, vemos o mesmo fenômeno em grupos como os Três Mosqueteiros ou até nos personagens principais de Harry Potter. Há algo profundamente satisfatório nessa configuração que transcende culturas.
Alguns estudiosos sugerem que trios funcionam bem porque refletem:
O modelo id, ego e superego da psicologia freudiana
A estrutura básica de muitas histórias míticas (herói, mentor e aliado)
Nossa tendência natural de classificar informações em três partes
O impacto dos trios na narrativa e no merchandising

Além das vantagens narrativas, a formação de trios protagonistas tem implicações comerciais significativas. As editoras e estúdios de animação perceberam que três personagens principais permitem uma diversificação mais eficiente de produtos licenciados. Enquanto um único protagonista pode saturar o mercado, três oferecem variedade sem sobrecarregar os fãs.
Veja como isso funciona na prática:
Cada membro do trio atrai um tipo diferente de consumidor
Permite a criação de linhas de produtos temáticas (roupas, acessórios, colecionáveis)
Facilita crossovers e parcerias com outras franquias
Amplia o apelo em jogos, onde cada personagem pode ter um estilo de jogo único
Não é coincidência que os trios mais icônicos tenham versões em action figures, camisetas e até colaborações com marcas de luxo. A fórmula do trio, portanto, não é apenas uma escolha artística, mas uma estratégia de negócios comprovada.
Evolução dos trios ao longo das décadas
Se observarmos a trajetória dos trios shonen desde os anos 80 até hoje, perceberemos uma evolução interessante nos arquétipos. Enquanto nos anos 90 era comum ver o clássico "forte, inteligente e engraçado", as dinâmicas contemporâneas se tornaram mais complexas e menos estereotipadas.
Em My Hero Academia, por exemplo, Deku, Bakugo e Todoroki representam três abordagens distintas para a heroísmo, cada uma com suas contradições internas. Bakugo não é simplesmente o rival temperamental - sua evolução mostra camadas de vulnerabilidade e crescimento. Todoroki, por sua vez, desafia a noção de que o personagem "frio" precisa ser emocionalmente distante.
Essa sofisticação reflete mudanças na sociedade e nas expectativas do público. Os fãs atuais demandam personagens mais tridimensionais, cujas motivações vão além dos arquétipos tradicionais. O trio moderno precisa equilibrar:
Complexidade psicológica individual
Dinâmicas interpessoais mutáveis
Arcos de crescimento que se influenciam mutuamente
Representatividade e diversidade
Quando a fórmula falha: lições de trios mal-sucedidos
Nem todas as tentativas de criar trios protagonistas atingem o mesmo nível de sucesso. Algumas obras cometem erros comuns que prejudicam a dinâmica do grupo. Um problema frequente é o que os fãs chamam de "terceira roda" - quando um dos três membros fica claramente em desvantagem em termos de desenvolvimento ou relevância para a trama.
Casos como Sakura em Naruto (especialmente na primeira parte da série) ou Orihime em Bleach geraram debates acalorados entre os fãs. O que diferencia esses exemplos dos trios bem-sucedidos? Algumas possíveis explicações:
Falta de objetivos pessoais independentes do protagonista principal
Poderes ou habilidades que não evoluem na mesma proporção que os outros membros
Pouca influência nos rumos da narrativa principal
Arquétipos muito limitantes que não permitem crescimento
Interessantemente, muitos desses "trios problemáticos" ocorrem quando há uma personagem feminina cujo papel se limita a ser interesse romântico ou suporte emocional, sem agência própria. Isso levou a discussões importantes sobre representação de gênero nos shonens modernos.
O futuro dos trios protagonistas
Com as mudanças no panorama dos mangás e animes - incluindo o crescimento de gêneros como isekai e a influência das plataformas de streaming - como será a evolução dessa fórmula consagrada? Algumas tendências emergentes sugerem caminhos interessantes:
Trios não-tradicionais, como grupos onde os membros não são necessariamente aliados
Dinâmicas mais fluidas, com personagens alternando entre papéis
Maior diversidade étnica, de gênero e orientação sexual
Protagonistas que desafiam categorizações fáceis de arquétipos
Séries como Jujutsu Kaisen já experimentam com essas variações, apresentando trios onde as relações de poder e hierarquia são constantemente questionadas. E você, acha que a fórmula clássica ainda tem espaço, ou estamos prestes a ver o surgimento de novas estruturas narrativas?
Com informações do: IGN Brasil